quarta-feira, 17 de junho de 2009

Aos meus piores professores

É preciso mais do que pescoço para prender minha cabeça no meu corpo. É preciso que algo me surpreenda, que me chame atenção. A partir do momento em que a sala escurece e a voz do professor narra o que está escrito nos slides, minha mente começa a se despedir de mim. “Será que eu devo almoçar com o Marcelo?” “Tenho que achar uma sandália preta. Tem um casamento no final de semana” E por aí vai. Quando olho para frente, a boca do professor abre e fecha e eu não tenho a menor idéia sobre o que ele possa estar falando.

Reparo então nos meus colegas. Uma tenta puxar a cutícula do dedo indicador com a boca, outra inspeciona cuidadosamente as pontas duplas do cabelo, a que senta ao meu lado me cutuca e sussurra “Guria, são onze horas ainda...”Isso sem contar os que mexem no celular e balançam os pés. Definitivamente, meu problema não é um caso isolado. Chego à conclusão que talvez essa dificuldade de concentração seja menos um traço da minha personalidade e mais uma deficiência de determinados professores no cumprimento da função que lhes garante o pão e o cafezinho.

Ensinar não é para qualquer um. Não basta só entender do assunto, tem que saber e querer transmitir. No curso de Jornalismo da UFSC, alguns professores deixaram de ser aquele que ensina para ser aquele que faz a chamada, coloca meia dúzia de livros no xérox, prepara uma apresentação de Power Point, passa alguns conceitos nas primeiras aulas e divide o resto do semestre em cômodos, mas insuportáveis, seminários.

Os seminários são a escolha preferencial dos preguiçosos. Os professores viram alunos e os alunos tentam explicar o pouco que eles entenderam do texto. Não de todo o texto, daquelas 20 páginas que eram a “sua parte”. Sem experiência nenhuma no assunto e didática zero, o que poderia ser uma parte da metodologia de ensino passa a ser um método de tortura para os demais colegas. Os comentários dos docentes são, por vezes, medíocres e se limitam a repetir com palavras um pouco menos comuns o que o grupo acabou de dizer. Quando muito.

Será que pensam que a gente não nota que certos professores faltam mais do que os alunos relapsos? Será que acham que a gente não percebe quando assiste a uma aula enjambrada? Será que eles não veem o quanto incomoda quando um doutor nos exige que façamos algo que nem ele sabe fazer, sem ter a menor noção da complexidade e do tempo necessário para o trabalho?

Eu queria deixar claro que eu percebo. E olha que sou uma aluna mediana. Não copio tudo, chego sempre alguns minutos atrasada e, muitas vezes, não leio o que estava previsto. Estou consciente que a minha desorganização prejudica meu desempenho acadêmico e sou responsável por isso. Mas pelo menos tenho o consolo de que a minha desatenção atinge apenas a mim. Os maus educadores não têm essa justificativa. O descaso deles desestimula uma sala inteira.

E isso que sou uma aluna média. Imaginem o que os bons pensam de vocês...

***

PS: Do mesmo modo como tive professores lastimáveis, tive também professores muito empenhados e que influenciaram positivamente não só a minha vida acadêmica, quanto pessoal. Que recomendaram bons livros, que me atenderam com atenção, que me sugeriram diversas saídas para solucionar uma dúvida. Guardo seus ensinamentos com todo o respeito, carinho e consideração e agradeço por terem deixado o exemplo do profissional com que quero parecer.

6 comentários:

  1. É por essas e outras que escrevi meu livro, "A Tragicomédia Acadêmica - Contos Imediatos do Terceiro Grau". Em alguns contos faço comentários semelhantes. (Em O Aluno Genial, há a mesma crítica aos seminários.)

    http://yurivieira.com/content/view/250/80

    Abraço!

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  2. Sarah, esses exemplos de viagem na hora dos ppts são todos eu?

    hahahahahahah

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  3. A-v-e, pior ainda e' desconfiar de que os mesmos slides sao mostrados desde o inicio do curso mais ou menos. Ate' na inovacao e na criatividade alguns conseguem pecar!

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  4. E quem diria - a Sarah Westphal existe mesmo! Já deve inclusive estar meio cansada de ouvir falar a respeito do episódio agora mais reconhecido, o da "verdadeira autora do Quase", já meio antigo... mas que me encantou pra caramba. Metida que sou, resolvi pesquisar teu nome no google, depois no orkut, chegando até aqui.

    Sou aluna do Waltinho e tive a primeira aula sobre "crônicas" do ano hoje (finalmente esquecendo as chatas dissertações), a qual começou com um texto já meu conhecido, antigo "about me" do meu orkut. O professor foi lendo, depois de ter dito que era de uma antiga aluna... E eu comecei a rir, pensando em como o professor Walter, meu ídolo, podia ser tão ingênuo e desinformado pra não perceber que aquilo era cópia de um famoso trecho de Luis Fernando Veríssimo. Imagina o tamanho da minha surpresa ao ouvir a história inteira, contada com orgulho pelo professor.

    Resolvi te achar, além da curiosidade, só pra contar o quão ridícula eu fiquei, de boca aberta e arrepiada, na segunda fila à esquerda, da sala 30 do Energia, hoje de manhã. Teu texto é incrível mesmo - isso eu já achava quando o atribuía a Veríssimo - mas, mais do que isso, agora que eu sei da tua história, ela também me despertou certa vontade de te contatar. Fez medicina, largou, começou Jornalismo. Por sinal o curso pro qual vou prestar vestibular no fim do ano, na UFSC e na UFRJ. Por amor à palavra, à comunicação, ao escrever sem parar, paixão de infância que nunca parou. E me deparo com esse texto sobre os professores da UFSC, onde o curso de Jornalismo é tão conceituado e recomendado por todos... E agora?

    Parabéns mesmo, Sarah! Pra quem ama escrever e não confia tanto no que faz, a história do "Quase" é uma inspiração imensa e fonte indiscutível de ânimo e vontade.
    Assim que tiver um tempinho (terceirão é fogo, ainda lembra?), quero ler tudo aqui com calma.

    Um beijão de quem não quer nem ver o tamanho desse comentário (sempre me prolongo!),
    Isa Cecatto.

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  5. É, Isa, o diploma caiu. Mas desanima, não, hehe.
    Passei aqui só pra registrar, Sarah! :)

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  6. ilovesarinha.com.br That´s it!!!
    Orgulho orgulho e muita saudade de vc viu???
    te amo queridona... mesmo de longe!!!

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