sexta-feira, 30 de maio de 2014

O mundo acabou e ninguém percebeu.


Sérgio Malandro está na tv. O papa renunciou. Abri a janela e tinha geado. São Paulo, maio, depois de um dia de sol. Faltam três semanas para a copa e, no país do futebol, não se vê uma bandeirinha na janela. No primeiro Big Brother, lembro de fechar os olhos e pensar o que eu faria com um milhão de reais. Hoje qualquer apartamento custa um milhão e esse país de milionários para quando tem greve de ônibus.

“Tem alguma coisa muito estranha”, comentei com um amigo. Ele se inclinou em minha direção e me deu o diagnóstico como quem conta um segredo.

– Lembra, em 2012, quando diziam que o mundo ia acabar?
   Pois é.

Ele não precisou mais explicar. O que eu esperava? Um dilúvio? Repensei minhas hipóteses para o dia do apocalipse e me achei ingênua em minhas expectativas. Esperava um fim do mundo barulhento como nos filmes de ação, explosões estilo 11 de setembro e uma pane geral dos computadores. Mas o mundo acabou e a gente ficou aqui.

Morreram: os telefones fixos, as videolocadoras, as TVs de tubo, os dicionários de bolso, os filmes de 12, 24 e 36 poses. Morreram os bailes debutante, as famílias margarina, o glamour das viagens de avião. Nasceram as tomadas brasileiras. As pilhas sobreviveram a contragosto. O yakult se manteve firme e forte com suas garrafinhas sempre menores que a minha vontade. A hierarquia ficou fora de moda. O sonho americano caducou.

Abrimos a nossa vida, compartilhamos intimidades, travamos a porta do carro antes de colocar o cinto. Mudaram umas coisas importantes, como a divisão entre país rico e pobre, a nossa noção de clima, de sexo como determinante de sexualidade. O tédio foi substituído por um fuzuê de novidades e ficou tudo tão rápido que hoje eu não tenho paciência pra fritar um bife.

Nesses últimos anos, repensamos a família, o significado do trabalho, os relacionamentos. Todos os dias, olho para as pessoas no metrô, com olhos concentrados e polegares ativos, e não me resta nenhuma dúvida de que enterramos o mundo como se conhecia. O que vem por aí é imprevisível e é inútil adivinhar. Pensando bem, já que o mundo acabou mesmo, não tem mais por que se preocupar tanto. Semana passada, por exemplo, fui pra balada de polaina.


quarta-feira, 7 de maio de 2014

A segunda chance

Saímos ontem.

Saímos ontem e fazia tempo que a gente não se via, mas é estranho como eu me lembrava de você com tanto carinho. Quando eu te encontrei de novo, mesmo antes de entrar no bar, vi que todo o meu nervosismo foi perda de tempo. Ainda era você, e me riu com o mesmo riso fácil que eu já conhecia. 

Conversamos a noite toda, eu bebi um pouco a mais porque é o tipo de coisa que faço quando estou feliz. E, porque tinha essa desculpa, achei normal querer voltar pra sua casa como se fosse antigamente. Cada hora contigo me fez renovar alguns verões. De repente, éramos nós dois tentando acertar um beijo num mar cheio de onda, aquela ansiedade adolescente e um biquíni emprestado que não me caiu muito bem. Era você ligando pra dar uma volta na praia e eu inventando uma desculpa pra conseguir sair de casa. Lembro de te olhar de longe lá no pátio do colégio e das mensagens no meu Startac de adesivos coloridos. 

Ao te ver deitado na cama, achei engraçadas suas pernas finas e reparei que antes você tinha mais cabelo. Apesar de tudo, estávamos melhor agora. Mais seguros agora. Será? Aí você falou a frase que me fez arregalar os olhos já pesados de sono. Encostou o nariz no meu pescoço e disse: "Queria ficar com você assim para sempre". Na hora eu soube que não era verdade. Se você realmente se importasse tomaria mais cuidado. Não iria querer deixar as coisas muito claras. A essa altura do campeonato, a gente sabe que, na dúvida, é preferível não dizer. Fiquei ali deitada mais um pouco e vi que me precipitei.

Resolvi não estragar minhas lembranças e logo que você dormiu eu fui embora a fim de nos poupar de qualquer outra mentira. Mas você não resistiu e me mandou uma mensagem só para dizer que ligaria. 

Olha que chato: você me enganou mais uma vez.

Ontem eu achei um emprego. Hoje eu pedi demissão.

Ontem eu achei um emprego. Hoje eu pedi demissão. Vou explicar o motivo para que vocês se saiam melhor do que eu. Desemprego mata a aut...