sexta-feira, 15 de fevereiro de 2013

O placar é: zero pra mim, 42 pra academia


No dia em que eu for pra academia de manhã

estarei prestes a conseguir tudo o que eu quero da vida. 

Porque, por enquanto, não existe nada mais difícil. 

Acerto o despertador animada: chegarei ao trabalho disposta, 

terei o resto do dia só para mim e não sentirei nem um pingo 

de remorso ao comer o massudo, mas gostoso, pão de queijo. 


Vou mais longe: penso que quando tiver 42 estarei 

melhor que hoje e já me imagino dando entrevistas 

sobre como conciliar a boa forma a uma agenda tão atribulada. 


O problema é que, quando o celular toca, às 6h15 da manhã, 

nada disso me convence. Antes de abrir o olho eu lembro

que só a ida para a agência já é uma maratona e

eu, trabalhadora que sou, mereço pelo menos mais

dez minutos de alegria até a musiquinha me irritar de novo. 


Minha tendência ao sedentarismo torna-se evidente assim que

eu entro no ônibus. Sou tomada por uma inveja horrível 

de quem conseguiu sentar. Cabeças pendentes, olhos fechados, 

bocejos ofensivos, e eu ali, espremida e em pé. 


Tenho desenvolvido minha capacidade de observação 

para aumentar as chances de conseguir um lugar 

e já consigo identificar previamente a expressão de quem vai descer. 

Sinto-me profundamente chateada toda vez que a porta abre

e ninguém salta. Precisava me dar falsas esperanças? 


Suspendo o braço para me equilibrar e percebo

que tenho consistência de pudim. Começo a pensar que

nas futuras entrevistas é mais provável que eu discorra

sobre a relatividade do tempo em cima da esteira

ou sobre como tenho sido assediada pelo queijo gorgonzola. 


Na verdade, talvez seja melhor esquecer das entrevistas. 

Quem dá entrevistas supera coisas importantes. 

Eu travo na academia.



terça-feira, 5 de fevereiro de 2013

Fala-se muito em silêncio


– E a festa?

– Não curti muito. Voltei pra casa antes das duas da manhã.
   Mas estava boa sim, teve atropelamento e tudo...

– Engraçadinho você....

– E você? Ficou braba comigo, se acabou no sertanejo e
   voltou louca para me contar, né??

– Não exagera : )

– Fala aí... 

– Você e o seu "tem que deixar rolar"...
   Chato.

– Chato é ficar sem você.


A frase era sincera. Era chato ficar sem ela. Queria encontrá-la

agora mesmo na esquina entre o pescoço e o ombro

e beijá-la bem mansinho. Do outro lado da tela,

ela sorriu tranquila e se esticou um pouco,

reparou as pernas vermelhas, o notebook quente no colo.


Continuaram a conversa e é uma pena que não possam se encontrar.

Existem paredes de concreto e algumas cidades entre eles.

Vivem toda a falta e toda a vontade sem que se escute um suspiro,

ignoram mutuamente a suavidade do toque

e o mover das sobrancelhas.


Usam tantas palavras que chegam a ter a impressão

de que se falam o dia todo. Mal percebem que nenhuma

chega a ser articulada, que os comentários são entregues

 sem volume ou entonação.


As emoções estão simplificadas.

Dois pontos e parêntesis para demonstrar carinho;

espanto ou felicidade viraram pontos de exclamação;

as interrogações se multiplicam conforme

a curiosidade ou impaciência da pergunta.


Todos os dias, o círculo verde ao lado do nome

faz com que se sintam mais próximos.

É como se chegasse uma visita,

embora a porta do apartamento esteja sempre trancada.


O ano é 2013.

Ultimamente, fala-se muito em silêncio.



Ontem eu achei um emprego. Hoje eu pedi demissão.

Ontem eu achei um emprego. Hoje eu pedi demissão. Vou explicar o motivo para que vocês se saiam melhor do que eu. Desemprego mata a aut...