quinta-feira, 29 de agosto de 2013

Três historinhas reais




O que não dizer para uma criança


Na fila da temakeria, escuto a conversa entre a mãe e a menina.

A menina, de não mais que dois anos, havia tirado o casaco,

deixando aparente sua blusa de pijama.

“Saí na pressa e ela não quis trocar de roupa”, comenta

a mãe em voz alta, como quem se desculpa em público.

O tom é doce, mas fica evidente que ela gostaria

de ver a filha mais arrumada.

A grande questão é que a blusa de urso não combina com a calça.

Por isso, ela repete para que a menina coloque o casaco.

A menina nem liga, entretida em chamar a garçonete

para pedir um copo d’ água, sem quase nem saber falar.

O olhinho inteligente e sua fofura natural de criança

conquistam a fila toda e mais algumas mesas perto da porta.

A menina vira o centro das atenções.

Um pouco nervosa pelo improviso da roupa, a mãe apela:

– Você está muito feia com essa blusa.

A menina estranha, confere silenciosamente a estampa da blusa,

segura a aplicação do bichinho e mostra pra mãe,

como se tivesse havido algum engano:

– É o urso, mamãe...

O argumento veio tímido, mas me convenceu.

Como que o amiguinho urso poderia ser feio? Para quem?

A mãe, mesmo frente a tanta inocência, continuou

e carinhosamente falou as piores palavras do mundo:

– Eu estou com vergonha de você.





O que se dizer para uma criança


A menina tinha ganhado um patins e notou que

as amiguinhas ficaram diferentes.

Não queriam mais brincar com ela como antes.

A menina ficou chateada e contou a história para a mãe,

que muito sabiamente perguntou:

- Elas meninas também têm patins?

- Não.

- Então empresta...





O que a minha mãe me disse

Eu tinha uns 5 anos. Era véspera de dia das mães

e nós íamos fazer um cartão. No dia anterior,

as tias do colégio avisaram que todos deveriam levar tesoura.

A regra era claríssima: quem esquecesse

a tesoura ficaria sem cartão.

Já no caminho para a aula, olho para o meu material, 

percebo que esqueci e começo a chorar compulsivamente.

Conto para a mãe o motivo do meu desespero.

Ela entende e ela fala bem calma:

– Querida, é só uma tesoura. Você vai chegar lá, explicar

que você esqueceu e alguém vai te emprestar.

Até hoje, sempre que alguma coisa me preocupa

eu tento me lembrar dessa cena.

Felizmente descubro que tenho bem menos problemas

do que tesouras.

2 comentários:

  1. A boa narrativa se revela plena nos textos de Sarah, mesmo que nos micro-contos. A palavra na medida certa.

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  2. Olá.
    O psicológico infantil pode direcionar a vida inteira de um ser.

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