quarta-feira, 8 de julho de 2015

Solidão



Acordou sem querer sair da cama e seguiu sem querer ficar. Descobriu pela janela um dia branco. Checou o telefone igual no quarto que dividia com carregadores e livros. Era mais um sábado quieto no décimo nono.

Olhou os riscos no chão de taco e o brilho fosco da madeira revelou o rastro de algum produto de limpeza. Cumprimentou o espelho antigo e reparou seu rosto diferente. O passar do tempo havia lhe cavado vincos na bochecha. “Tem um parêntesis no meu sorriso“, pensou em voz alta.

Sentou-se de pernas cruzadas no sofá e, por falta de vontade, continuou de pijama. Mexeu seu café com as costas do garfo e formulou para si que solidão era uma tristeza que dava muita preguiça. Era quando a louça se acumulava na pia e as roupas formavam montanhas tortas sobre as cadeiras. Era quando a mesa se enfeava dos papéis desimportantes, recibos dobrados e sacolas que já não traziam nada. Era quando o pó se organizava no caminho das esponjas sem incomodar. Era simplesmente deixar tudo como estava e ir vivendo pelos meios até que se encontrasse, de novo, alguma graça.

Solidão, para ela, era não ter nenhuma pressa. Era essa angustia demorada, essa neurose morna que não ia embora. A cabeça repetia perguntas sem resposta. Por mais que se esforçasse, cansava logo dos programas de TV e se perdia com a vista da janela. Era altura demais para não se sentir miúda e gente demais para não se sentir muito só.

Pensou nas pessoas queridas olhando as fotos da geladeira. Releu novamente os bilhetes para se sentir importante. Lembrou como era difícil, nesse momento, eleger algum sonho como seu. Solidão era essa ânsia por companhia que a acompanhava desde sempre. Era essa autopiedade que a engolia. Era esse tédio que ela vomitava. Era saber que não era esperada. Era essa sensação de que, em alguma esfera da sua vida, ela precisava ser salva. Solidão era o que a fazia andar sem roteiro e desejar de volta o tempo em que o sorriso não era só mais uma marca.


Um comentário:

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