A moça do metrô não tinha um braço. Reparei quando cheguei mais perto. Estranhei o brilho da unha pintada e só depois percebi a prótese de plástico que, embora imitasse todas as ranhuras de uma mão humana, não parecia, em nenhuma instância, humana.
Seu movimento, com o andar do trem, não condizia com o corpo da moça. Permanecia semi aberta, congelada na eminência de pegar alguma coisa, balançava dura as unhas coloridas. A moça parecia cansada, como todos naquele vagão. Fiquei pensando na sua rotina. Teria lavado o cabelo com uma mão só, assim como vestiu a meia-calça e abotoou a camisa de cetim. Arrumou-se bastante, mas, pelo menos para mim, foi impossível não notar a falta.
Tentei olhar com mais carinho para a
prótese que a princípio me pareceu assustadora. Era a mão da moça. Assim como
eu tinha a minha. Reparei nos meus dedos avermelhados pela pressão da sacola, as veias saltadas no dorso. Lembrei que eu tocava. Que eu sentia. Fazia
poucas horas que havia amanhecido e eu já tinha precisado tanto de tudo.
Fui inundada por aquela sensação de
egoísmo que sempre me percorre quando eu lembro do quanto eu tenho a agradecer. É
esquisito: a gente se sente tão inteira, mas é tão limitada. A moça do metrô
não tinha um braço. Precisei vê-la para lembrar dos meus.
Fiquei de comentar ao lê-la noutra ocasião. Esse texto emocionou-me e em algumas passagens recordei que certo dia também vivenciei o impacto ao deparar-me com pessoas vítimas de amputação tendo me ocorrido similares pensamentos e de mais trágico na primeira oportunidade foi justamente, a aberração do contraste com um membro normal. Tamanho, cor e etc. Uma prótese para corrigir um trauma e a causar-nos um outro, a de constatar que muitas vezes julga-mo-nos incapazes e deficientes quando na verdade somos perfeitos e abençoados por ter tudo o que temos e nada em vias de nos ser abrevados. Amei sua crônica.
ResponderExcluirCRÔNICA DO COTIDIANO COMO EU GOSTO . PERCEBER NO OUTRO NOSSAS IMPERFEIÇÕES !
ResponderExcluirCRÔNICA COM POUCAS PALAVRAS . NOS USA DENOMINAMOS DE CONTOS CURTOS .POUCAS PALAVRAS CONTAR A HISTÓRIA DE UMA VIDA . PARABÉNS
No comentário anterior nesta crônica, onde lê-se - abrevados, leia-se "abreviados".
ResponderExcluirRealmente precisamos agradecer mas, reclamamos de barriga cheia!
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